Uma vez encontrei um mestre indiano que ensinava meditação, fiquei em sua companhia alguns dias, ouvindo-o falar e meditando algumas horas por dia. Me lembro de uma história contada: ele perguntou à turma ao olhar para uma de suas mãos, sobre o quanto sabemos realmente de tudo o que acontecia em nossa mão, a pressão em cada dedo, a velocidade do sangue, todas as reações químicas, as trocas das substâncias intracelulares, a temperatura de cada célula? Obviamente ninguém sabia e seria bem difícil saber tudo o que acontecia. Ele então complementou: se você sabe pouca coisa sobre a sua mão, quem dirá sobre o resto da sua vida. Falava ele sobre soltar o controle, entregar e confiar na vida. Já encontrei outros professores de yoga e meditação falando sobre a entrega, como parte fundamental da meditação e de como viver melhor. Gosto de pensar sobre essas práticas, yoga e meditação, como tentativas de uma pessoa ou conjunto de pessoas para lidar com a dificuldade que é ter sentimentos em frente à vida, como a angústia e o vazio. Meditar, exercitar, encontrar sentido, algum tipo de organização que possa ajudar a viver a vida – em contraponto com a falta de sentido que a experiência da vida pode nos fazer concluir.
Soltar – deixar de controlar, entregar, há muitas citações dessas quando se fala sobre meditação. Minha interpretação vai de encontro a uma outra história, a esperança de que se eu soltar, as coisas vão se ajustar e tudo vai acontecer como deveria como em uma orquestra guiada por um maestro, esse a vida em si – ao mesmo tempo querer ser organizado pelo maestro, como também preenchido por ele, soltar ou entregar, significava viver uma vida plena e suprida por algo que está além de mim, o qual não tenho muito conhecimento ou controle. Por isso o soltar. Lembrando que a meditação, assim como o yoga, eventualmente mencionam esse passo como fundamental para uma experiência a ser realizadora em vida. Porém trarei uma reviravolta nessa lógica.
Soltar para que algo me segure em baixo, levanta alguns sentimentos como dependência, frustração, vício. Talvez a proposta seja criar responsabilidade, pelo que se vive, se sente e como as coisas são, e que ao mesmo tempo não temos controle por muitas coisas, as contingências sempre nos surpreendem. O mundo não cansa de nos afirmar que a organização é uma necessidade do homem, não necessariamente algo que existe em si. Andar por uma linha entre tentar se responsabilizar pelos acontecimentos que me envolvem também é uma forma de atuar na realidade, e não apenas viver em dependência – e realmente perceber que isso não passa de um jogo que não corresponde com a realidade da existência, essa quiçá incompreensível para nós, seres humanos. Esse encontro de forças entre atuar em um lugar em que causa e efeito não fazem parte, é uma prospecção de viver em uma realidade inventada e ao mesmo tempo saber que ela é inventada, viver um jogo sabendo – pois não há outra saída a não ser reconhecer a inconstância e brincar com ela. Como uma vez um uma história que ouvi – um sábio é aquele que veste um personagem por saber não haver outra forma.