Uma hipótese sobre como o caráter surge

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Eu vejo um recém nascido humano como um ser sem nenhuma barreira entre ele e o mundo. O que será que ele sente, quais são suas experiências? Apesar de algo já o são insinuadas, como o que esperar dele, seu nome, o imaginário dos pais já está cheio de classificações e essas podem ser projetadas ao infante? Ele as assimila logo após o nascimento? Creio que não há nada que dê limite entre ele e o mundo, sendo mesmo possível de imaginar que ele e o seu redor são um, sem diferença ou separação, um coisa apenas. Em seguida com o passar do tempo, o que os pais esperam dessa criatura o tentam moldar, mas o recém nascido, penso que tem uma experiência peculiar, de unidade.

Me pergunto quais influências são vividas por esse ser? Imagino que o mundo está todo disponível para sua experiência, como se o mundo se concentrasse em uma pessoa, pois essa não tem classificação e barreiras erguidas. Essa divisões, são o que mais tarde será a diferença entre eu e o mundo, o que sou eu e o que é o outro. Mas antes disso, o que pode chegar a ser experimentado por um ser? Me vem uma imagem que tenta explicar esse momento um oceano, como é estar vivo e ser um oceano? Deve ser uma experiência arrebatadora contendo tudo.

Aos poucos nem tudo entra, algo deve ficar de fora, e o eu e o outro começam a ter lugares mais definidos. E o eu pode ser algo menor em comparação a tudo que deve ocupar outro espaço. O desejo de retornar ao momento total de infante continua, mas tudo não cabe novamente no pote que foi moldado para demarcar a divisão entre o eu e o mundo. Esse retorno é algo não possível, um retorno ao oceano é o que anseia esse ser dividido, ser novamente um apenas. Quem sabe o eu pode se ampliar ao ponto de caber cada vez mais oceano, ampliando seu campo de experiência ao ponto de poder sentir mais do que o eu bem definido sentiria.

O que sai do conhecido adquirido pela criação do eu, causa-lhe medo e desconhecimento, isso explicaria o medo do mundo, do que está fora, tudo poderia comprometer as linhas bem demarcadas do eu. Mas o contato com o que está fora pode trazer mais opções de existir para esse eu, seria esse balanço, deixar entrar cada vez mais a medida que os limites do eu se aumentam. Direcionando a caber de volta o oceano, mais liberdade de ação, de sentimentos e sensações. Imagine como é a experiência de um recém nascido, sem limites para vivenciar, ondas de existência juntas em um ser, sem separação.

Com a limitação de criar formas ainda inscritas no eu, temos esse jogo de criação do mundo como maneira de simular as ondas existenciais vividas em um momento sem limites do infante. Estamos em um jogo de criação de opções para poder expandir da definições do eu, agora a nossa maneira, não mais de maneira passiva como no recém nascido. Criamos o que o podemos experimentar, antes indo junto dos movimentos da maré, agora ou em um possível futuro dar direção para onde a ondas da existência podem passar. Essas escolhas ao meu ver são particulares e assim o caráter se compõem, com escolhas dessas possibilidades de criação podem ir em qualquer direção, mas só algumas são escolhidas e seguidas, a depender de como o eu foi estruturado ao se separar do mundo. Essa estruturação é o fio de condução de volta a integrar partes do mundo de volta ao eu, esse fio pode ser chamado de caráter.